Crise fiscal paraguaia leva eleito a falar mais duro contra o Mercosul

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A situação fiscal do Paraguai levou o presidente eleito do país, Horacio Cartes, a elevar o tom contra o Brasil e a Argentina em relação ao Mercosul nos últimos dias. Sem tradição no Partido Colorado, pelo qual se elegeu, e em minoria no Senado, Cartes abandonou o tom pragmático em relação ao ingresso da Venezuela no bloco econômico, aprovado depois que o Paraguai foi suspenso do grupo em junho do ano passado, por ter afastado em um processo sumário de "impeachment" o então presidente, Fernando Lugo.

No início deste mês, Cartes fez um acordo com o Partido Liberal Radical Autêntico, do atual presidente, Federico Franco, com quem está se desentendendo durante a transição, e iniciou a negociação para a repartição de seu ministério com os diversos setores do Partido Colorado, entre eles os que articularam a queda de Lugo.

O presidente eleito concordou em ceder a presidência da Câmara para os liberais e em lotear politicamente a indicação de magistrados. Cartes toma posse no dia 15 de agosto, mas o novo Congresso já assumiu no dia 1º. O déficit do setor público deve ir de 1,1% do PIB em 2012 para 2,3% neste ano, em função de uma política expansionista de gastos impulsionada pelos próprios colorados nos últimos anos, em que estavam na oposição. No Paraguai, o governo não pode contingenciar os gastos do Orçamento e os parlamentares podem criar despesas sem cobertura orçamentária.

"A crise fiscal criada para inviabilizar o governo Lugo caiu no colo de Cartes", comentou o cientista político José Carlos Rodríguez, ligado à oposição, e integrando do Cadep, um centro de estudos do país. Para tentar reequilibrar o caixa, Cartes articula o aumento dos impostos sobre o agronegócio, a principal fonte de recursos externos formais do Paraguai. A primeira proposta do presidente eleito, a de taxar a renda do campo, foi obstruída no Congresso, com forte atuação dos "lobbies" rurais. Como estratégia de pressão, Cartes fez aprovar no Senado a cobrança de 10% sobre o valor das exportações, projeto conhecido como "lei garrote".

Com a proposta tributária sobre a mesa, não há clima para o Congresso paraguaio aprovar formalmente a adesão da Venezuela, rejeitada na Legislatura passada. Sem a revisão desta decisão, o Paraguai deve continuar fora do bloco, agora em uma situação de exclusão voluntária.

Antes do acordo no Legislativo, Cartes havia feito diversas declarações simpáticas à reinserção do Paraguai no Mercosul, alegando a dependência econômica do país em relação a seus vizinhos. Mas neste mês divulgou um comunicado em que afirmou que o país não retornará ao bloco enquanto a Venezuela estiver na presidência pro-tempore. Dias depois, se comparou ao presidente Carlos Antonio Lopez, que entre 1844 e 1862 manteve o Paraguai em posição antagônica ao Brasil e Argentina. O filho deste presidente, Francisco Solano Lopez, conduziu o país durante a guerra contra a Tríplice Aliança, entre 1865 e 1870.

Para fontes do governo brasileiro, o panorama deve mudar depois de Cartes assumir a Presidência, quando o ministério estiver empossado, Franco estiver longe de poder e o presidente eleito ganhar poder de fogo para aprovar sua agenda no Congresso. "Somos escolados no Brasil em saber como funcionam esses processos de negociação com partidos", disse uma autoridade brasileira que acompanha de perto a transição paraguaia.

Para garantir a sua governabilidade, Cartes não está contando com a colaboração ativa de Franco. Na semana passada, o presidente eleito chegou a dizer que estava "herdando um cadáver" ao se referir à situação fiscal no Ministério da Saúde, onde afirmou haver um rombo de US$ 100 milhões. " A relação está tensa. A transição não está funcionando porque há divisões internas dentro do próprio governo Franco", comentou a jornalista Estela Ruiz Diaz, editora de Política do jornal "Ultima Hora".

Fonte: Valor Econômico

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