Para ONU, Brasil age contra mudança climática, mas não está livre dela
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- 01/12/14
Prestes a conduzir negociações entre países na COP 20, conferência das Nações Unidas sobre a mudança do clima, que começa nesta segunda-feira (1) em Lima, Christiana Figueres, secretária-executiva da ONU para o tema, sabe que tem em suas mãos uma bomba-relógio. Em um ano, precisa costurar e concluir com a ajuda de mais de 190 governos um mega-acordo que obrigará a redução de emissões de gases-estufa no planeta. O plano é que o documento seja assinado até o fim de 2015 e passe a vigorar a partir de 2020.
Em entrevista, Christiana alerta: os esforços apresentados até o momento por diversos países, incluindo Brasil, Estados Unidos, China e os estados-membros da União Europeia, não "fecham a conta do clima". Ou seja, os cortes nas emissões já feitos (incluindo as metas voluntárias ou cumpridas dentro do Protocolo de Kyoto) ou previstos pelos governos não vão conter o aquecimento em 2ºC até 2050. É preciso mais. Muito mais. Cada um à sua maneira e com os recursos de que dispõem, os países terão metas a cumprir para frear o aquecimento. Segundo um painel internacional de cientistas ligado à ONU, o IPCC, é preciso diminuir entre 40% e 70% do total de gases lançados até 2050 e zerar essa taxa até 2100. Gases-estufa como o dióxido de carbono (CO2) são liberados principalmente na queima de combustíveis fósseis, mas também com o desmatamento e outras atividades humanas. Caso isso não seja reduzido, segundo o IPCC, fenômenos extremos como secas, enchentes, degelo dos polos e aumento do nível dos mares serão mais frequentes.
"A soma total dos esforços que podem ser feitos não vai preencher a lacuna com relação aos 2ºC, que é a temperatura que podemos atingir", disse. "Por isso mesmo é que os governos estão olhando para dentro do acordo, pensando em como montar a trajetória em direção a esses dois graus ao longo do tempo. É uma conta que tem que ser fechada ao longo do tempo até que consigamos chegar à neutralidade de emissões na segunda metade deste século", explica Figueres.
A secretária da UNFCCC, sigla do braço da ONU para o clima, afirma que o Brasil é um dos países que mais têm contribuído na busca de uma solução para esta crise.
Em 2009, o governo federal apresentou metas voluntárias para diminuir entre 36,1% e 38,9% as emissões nacionais até 2020. Segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia, o país reduziu em 41,1% suas emissões de gases de efeito estufa em 2012 em comparação com 2005. Isso graças à queda do desflorestamento da Amazônia Legal.
No entanto, as emissões da área de energia aumentaram 35,9% no período, acompanhando o desenvolvimento do país. "Com certeza teremos altos e baixos, ano a ano, mas o que é importante é perceber a trajetória ao longo do tempo. E estamos confiantes de que o Brasil está reduzindo domesticamente suas emissões", disse ela.
Porém, fazer a lição de casa não vai poupar o país de sentir os efeitos da mudança climática, entre eles a seca, disse ela. "O Brasil é maravilhoso, mas não está livre dos impactos, assim como nenhuma nação está", complementa. O Sudeste brasileiro viveu nos últimos meses a pior estiagem em 80 anos, segundo dados da meteorologia. De acordo com Christiana, ainda é difícil dizer se o fenômeno é resultado direto da ação da mudança climática. Mas ressalta que "uma seca hoje não seria tão forte ou teria tanto impacto se não estivesse influenciada pela mudança do clima. "Estão se prolongando, tanto no tempo de duração, como na intensidade", explica.
Sobre o desmatamento da Amazônia, responsável pela maior parte das emissões nacionais, a secretária diz que o país está comprometido com um manejo sustentável da floresta e que "é preciso olhar a trajetória ao longo dos anos para avaliar o resultado da proteção do bioma".
Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe, o bioma perdeu 4.848 km² de florestas entre agosto de 2013 e julho de 2014, queda de 18% em relação ao período anterior. O total está longe do tão sonhado desmatamento zero, reivindicado por ambientalistas..
Ela admite que a forma de negociação feita pela ONU, por meio do consenso (quando todos precisam concordar com o que está na mesa), deixa "lenta, morosa e complexa" a obtenção de um resultado prático. Mas afirma que é a única maneira de garantir os interesses de cada país, "para que todos entendam que não se pode tomar uma decisão contra a vontade" dos demais.
Mas ela se diz esperançosa em obter um avanço na COP de Lima, que terá como foco conseguir o rascunho zero do novo tratado, que deve ser assinado pelos países em 2015, na conferência de Paris, e entrar em vigor a partir de 2020. "Não é porque sou eu quem estou dizendo. Mas porque os governos estão chegando com muita dedicação em poder trabalhar em direção a um novo rascunho para fecharmos um acordo", diz.
Fonte: G1